quinta-feira, 27 de março de 2014

Algumas notas sobre o célebre manifesto

O Manifesto para a Reestruturação da Dívida irrita muita gente porque, embora não implique concordar com tudo o que o Sócrates fez, vem dar-lhe razão em dois pontos muito importantes, e que são o essencial: a dívida não é para ser paga, mas sim para ser gerida (esta é a grande fratura ideológica dos dias de hoje), e não foi "ele" que criou a crise. O resto são narrativas.
Não deixa de ser interessante verificar que o mesmo José Sócrates que, em 2011, no debate com Francisco Louçã, não admitia "em nenhuma circunstância" a reestruturação da dívida, mesmo se o ajustamento corresse mal, pois tal seria "um prejuízo enorme" para o país e para a zona euro, venha agora defendê-la. Não foi Louçã que mudou: foi Sócrates. E isso não representa problema nenhum: eu também hoje já não partilho algumas opiniões que partilhava há uns anos. Sócrates neste aspeto mudou, e para melhor.
Quanto à "resposta" de José Gomes Ferreira, "Carta a uma geração errada": eu acho muito grave que se use o adjetivo "errado" em política. O manifesto é sobre política. A resposta de Gomes Ferreira é política. Mesmo que se tratasse só de economia, a economia não é uma ciência exata. Assenta em pressupostos que são muitas vezes políticos. Querer fazer crer que a política é uma ciência só acessível a cérebros privilegiados, e que só eles sabem o que é "certo" e "errado" (adjetivos que, repito, não devem ser aplicados a opções puramente políticas) é o mesmo que referir que "As pessoas normais, simples, parece que abarcam melhor esta realidade que pessoas informadas e com formação superior". É profundamente
antidemocrático.

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